Imagem de Fundo

Foto: Robina Weermeijer / Unsplash.

Infecção por vírus da mononucleose aumenta em 32 vezes o risco de esclerose múltipla, diz estudo

Pesquisa norte-americana avaliou amostras de plasma sanguíneo de mais de 10 mil jovens adultos; 955 deles tinham diagnóstico da doença autoimune   Por Amanda Milléo, da Agência Einstein   A maioria das pessoas diagnosticadas com esclerose múltipla teve contato com o vírus Epstein-Barr, causador da mononucleose, em algum momento da vida. Embora essa relação seja [...]

05/04/2022 07h00 Atualizado há 723 dias

Pesquisa norte-americana avaliou amostras de plasma sanguíneo de mais de 10 mil jovens adultos; 955 deles tinham diagnóstico da doença autoimune

Por Amanda Milléo, da Agência Einstein

A maioria das pessoas diagnosticadas com esclerose múltipla teve contato com o vírus Epstein-Barr, causador da mononucleose, em algum momento da vida. Embora essa relação seja conhecida dos especialistas, culpar a infecção viral pela doença autoimune não é tão simples. Estudo divulgado em meados de janeiro, no entanto, reforça essa associação e calcula que o risco de desenvolver a esclerose após o vírus aumenta em 32 vezes.

A pesquisa, divulgada pela revista científica Science, avaliou as amostras do plasma sanguíneo de mais de 10 mil jovens adultos norte-americanos, coletadas a cada seis meses. Destes, 955 receberam o diagnóstico da esclerose múltipla. A partir da análise, os pesquisadores perceberam que os jovens infectados pelo vírus da mononucleose tinham um risco maior de desenvolver a doença autoimune do que em comparação com outras infecções virais, também identificadas nas amostras.

“Os níveis séricos [quantidade de uma substância no sangue] do neurofilamento de cadeia leve, um biomarcador que indica a degeneração do nervo — característica da esclerose múltipla [EM] —, aumentavam apenas após a infecção pelo Epstein-Barr. Os achados não podem ser explicados por nenhum outro fator de risco para esclerose múltipla, e sugerem que o vírus do Epstein-Barr é a causa principal da EM”, destacam os autores na pesquisa.

Outras causas

De acordo com Denis Bernardi Bichuetti, professor associado da disciplina de Neurologia da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), uma relação de causa-efeito ainda não pode ser confirmada, mas o estudo norte-americano demonstra um gatilho entre o vírus do Epstein-Barr e a esclerose múltipla.

“Sabíamos que 100% dos pacientes são positivos para este vírus, porém 90% da população tem contato com o Epstein-Barr, então não é ele sozinho. Talvez no indivíduo com uma predisposição genética, com deficiência de vitamina D, que teve obesidade na adolescência, se ele tiver contato com o vírus, há 30 vezes mais risco de desenvolver a esclerose múltipla do que comparado a quem não teve a infecção”, explica o especialista, que também é membro titular da Academia Brasileira de Neurologia.

Embora também não seja uma ação de causa-efeito, apresentar níveis baixos de vitamina D e obesidade na adolescência (especialmente na região do abdome), além de manter uma alimentação rica em itens ultraprocessados podem contribuir no desencadeamento da doença. Segundo Bichuetti, os dois últimos são fatores que geram uma maior inflamação do organismo, que é uma condição associada à esclerose múltipla.

O especialista destaca ainda que, na pesquisa norte-americana, a amostra analisada era de jovens militares — profissão que expõe o indivíduo a altas taxas de estresse, outra condição pró-inflamatória. “Não é só o estresse que desenvolve a esclerose múltipla, mas talvez a amostra deles esteja um pouco viciada”, alerta.

Com relação às causas genéticas, o professor explica que não há muita influência. “O que às vezes vemos é uma família com algum histórico de doença autoimune. A mãe tem artrite, o tio, psoríase. Como é uma doença de causa multifatorial, pode existir um componente familiar que promova a autoimunidade. Mas, para algumas doenças, especialmente as de causas complexas, só ter a genética não é suficiente”, afirma.

Sintomas de alerta

 

Doença desmielinizante e autoimune que compromete o sistema nervoso central, a esclerose múltipla acontece quando, por uma ação errada do sistema imunológico, a bainha de mielina (capa de gordura que envolve os nervos) passa a ser atacada. Com isso, prejudica a condução dos estímulos nervosos, e a pessoa pode manifestar uma série de sintomas.

Embora variem de intensidade, alguns sinais são mais frequentes, de acordo com Rodrigo B. Thomaz, neurologista especialista em doenças desmielinizantes do Hospital Israelita Albert Einstein. “A doença se comporta de forma muito heterogênea, tanto na apresentação dos sintomas quanto na gravidade, dependendo das combinações genéticas e dos fatores ambientais. Mas existe um padrão, que é mais comum: pessoas com dificuldades visuais, alteração de sensibilidade no corpo, como por exemplo de temperatura, tato e equilíbrio”, exemplifica.

Segundo o especialista, o indivíduo diagnosticado pode apresentar também prejuízo na força muscular, que leva a uma maior dificuldade para caminhar. Sinais de formigamento de braços e pernas, alterações na fala, na função cognitiva e mesmo prejuízo no controle da urina podem sinalizar a condição.

“Quando falamos em esclerose múltipla, não são sintomas hiperagudos. Se da noite para o dia a pessoa acorda sem mexer os braços, é um AVC [Acidente Vascular Cerebral]. Na esclerose, são sintomas que acontecem ao longo de semanas, e que podem desaparecer espontaneamente. O formigamento na perna é mais comumente associado ao estresse e a perda visual, à conjuntivite. Por isso existe um atraso no diagnóstico”, complementa Denis Bichuetti, professor de Neurologia. Na maior parte das vezes, os sintomas tendem a aparecer entre os 20 e os 50 anos de idade, especialmente entre as mulheres.

O diagnóstico é feito por meio da análise dos sintomas e de exames como os de sangue e líquor, além da ressonância magnética do crânio e da coluna cervical. “As lesões da esclerose múltipla às vezes se assemelham às do HIV, hepatite B, lúpus, por isso é preciso excluir outros diagnósticos”, reforça Bichuetti.

Como tratar?

Os tratamentos disponíveis atualmente para a doença envolvem desde medicamentos imunossupressores — que diminuem a agressão do sistema imunológico à bainha de mielina — a medidas não farmacológicas. Neste caso, controle do estresse e manutenção de hábitos saudáveis, como alimentação adequada e exercícios físicos regulares, ajudam a controlar a evolução da doença. “Sabemos que os pacientes que colocam essas medidas em prática não apenas se sentem melhor como diminuem o acúmulo de lesões e de incapacidades futuras da doença”, destaca Bichuetti.

(Fonte: Agência Einstein)

Notícias relacionadas