
Poluição do ar: muito mais do que problemas respiratórios
Na semana em que o mundo discute os efeitos das mudanças climáticas, pesquisas indicam relação entre poluentes atmosféricos e o aumento de casos de doenças como glaucoma e Alzheimer
Por Nicola Ferreira, da Agência Einstein
Geralmente associada a problemas respiratórios, a poluição do ar progressivamente vem sendo relacionada a outras doenças. Agora, pesquisadores americanos da University of Southern California (USC) e britânicos da University College London observaram que moradores de regiões com maior concentração de partículas poluentes são mais suscetíveis ao desenvolvimento de enfermidades como Alzheimer e glaucoma.
Os efeitos da poluição do ar sobre a saúde vêm sendo cada vez mais observados e preocupam os estudiosos. Só no Brasil, sétimo maior emissor de gases que produzem o efeito estufa, houve um aumento de 14% nas mortes em decorrência da poluição nos últimos dez anos, segundo o Ministério da Saúde. A Organização Mundial da Saúde (OMS) afirma que aproximadamente 4,2 milhões de mortes prematuras são de responsabilidade da poluição atmosférica. Os mais afetados são as crianças e os idosos. “Os dois grupos têm menor capacidade de reação contra as doenças”, afirma a biomédica Nathália Villa, da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). “O sistema de defesa deles é mais frágil, e pouco tempo de contato com os poluentes já é suficiente para causar graves problemas.” O tema é de fundamental importância e entrou definitivamente na pauta das discussões de saúde pública e meio ambiente, como as que ocorrem durante a Cop-25 em Madri, Espanha.
Poluição e o Alzheimer
Para produzir o estudo, os pesquisadores americanos deram periodicamente exercícios de memória para 998 idosas de 73 a 87 anos. Todas as mulheres não apresentavam sinais de demência. Para analisar o desgaste e a atrofia do cérebro, os médicos as submeteram à ressonância magnética cerebral.
A partir do exame, foi observado que as idosas que moravam em áreas com maiores concentrações de poluentes tinham atrofias e problemas no cérebro semelhantes ao de pessoas com Alzheimer. “É a primeira pesquisa que mostra uma associação entre poluentes atmosféricos e alterações cerebrais vinculados a prejuízos à memória”, explica Andrew Petkus, da USC e coordenador da pesquisa.
Isso ocorre devido ao fato dos materiais particulados, partículas emitidas por gases poluentes derivados da queima de combustíveis fósseis, entrarem na corrente sanguínea e se acumularem no cérebro. “Por conta de diversos fatores, o cérebro não consegue se livrar dos compostos químicos que o afetam” – afirma a biomédica. O depósito provoca alterações na produção de proteínas que prejudicam o armazenamento das informações e podem promover, em pessoas saudáveis, quadros de demência semelhantes aos observados em indivíduos com Alzheimer.
A Alzheimer Disease Internation, órgão sem fins lucrativos que busca combater a doença, afirma que aproximadamente 50 milhões de pessoas são portadoras no mundo e que esse número deve triplicar até o ano de 2050. A informação agora publicada contribui com mais uma peça para a ciência estender seu conhecimento sobre a enfermidade, ainda sem cura. “Todo novo estudo nos aproxima de uma solução da epidemia de Alzheimer”, afirma Petkus.
Poluição e o glaucoma
“Evitar fontes de poluição pode fazer valer a pena para a saúde ocular, além de outras preocupações para a saúde”. O oftalmologista, Paul Foster, da University College London, foi um dos pesquisadores que apresentaram importantes dados sobre a relação entre a poluição do ar e o aumento do risco de surgimento de glaucoma.
O glaucoma é uma enfermidade degenerativa do nervo óptico (estrutura que conecta o olho com o cérebro, onde as informações captadas serão processadas). Ela provoca o estreitamento do campo visual e pode levar à perda da visão. Hoje, a doença é a principal causa de cegueira no mundo. Em 2020, segundo a OMS, a enfermidade deve atingir aproximadamente 80 milhões de pessoas no planeta.
A pesquisa britânica foi feita por meio de testes que mediam a pressão intraocular (dentro do olho) e imagens de tomografias que mediam a espessura da mácula (área central da retina). Participaram do estudo 111.370 indivíduos. As pessoas que moravam em bairros com maior quantidade de poluição por partículas finas possuíam pelo menos 6% mais chances de desenvolver glaucoma do que aqueles que habitavam áreas menos poluídas. Também estavam mais propensas a ter uma retina mais fina, um dos sintomas que resultam na doença. Os cientistas trabalham com duas hipóteses. A primeira é a de que a poluição provoca uma constrição dos vasos sanguíneos, contribuindo para o aumento da pressão ocular, característica da doença. “A segunda é a de que as partículas tenham efeito tóxico direto sobre o sistema, causando inflamação no sistema de captação das imagens pelo olho”, explica Sharon Chua, cientista participante do estudo.
“A maioria dos fatores de risco de glaucoma está fora de nosso controle, como idade avançada ou genética. É promissor que agora tenhamos identificado um segundo fator de risco para glaucoma, após pressão ocular, que pode ser modificado por mudanças de estilo de vida, tratamento ou política” – afirma o oftalmologista Foster. O estudo da faculdade londrina corroborou com informações que complementam antigas pesquisas que chegaram a afirmar que moradores de zonas urbanas têm 50% a mais de predisposição ao glaucoma do que aqueles que moram na zona rural.
Benefícios de diminuir a contaminação de poluentes
Um estudo realizado pelo Fórum Internacional das Sociedades Respiratórias (FIRS) constatou que quanto menor a concentração de poluentes na região, melhor a saúde. Uns dos testes mostrou que uma semana longe da poluição pode diminuir em 13% a mortalidade em decorrência da poluição. 26% das pessoas que participaram da pesquisa tiveram uma redução de problemas cardíacos e 32% em derrames. Os mais beneficiados foram aqueles que não fumavam.
“Sabíamos que havia benefícios no controle da poluição, mas a magnitude e as conquistas apresentadas em pouco tempo foram impressionantes” – afirmou o pneumologista e líder da pesquisa Dean Schraufnagel.
Outro evento apresentou uma melhora significativa. O fechamento por 13 meses de uma mina de ferro no estado de Utah, nos Estados Unidos, coincidiu com a diminuição de hospitalizações por pneumonia, bronquite e asma. Foi observado também que as abstenções escolares e a mortalidade diária caíram 40% e 16%, respectivamente. Além disso, houve menos casos de nascimento de bebês prematuros.
Schraufnagel está esperançoso com o futuro. “A poluição do ar é um risco à saúde extremamente fácil de resolver. Crescimento urbano, somado a expansão industrial, aquecimento global e novas pesquisas que mostram os problemas dessa poluição, aumentam o grau de urgência para controlarmos esse problema”.
(Fonte: Agência Einstein)