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Número de hemofílicos pode ser três vezes maior do que pensado

Pesquisa canadense sugere que o número de hemofílicos ao redor do mundo é três vezes maior do que o imaginado. Essa informação pode ser fundamental para governos prepararem os sistemas de saúde e os investimentos relacionados à saúde.

17/04/2020 09h15 Atualizado há 4 anos

Por Nicola Ferreira, da Agência Einstein

Quarta nação com mais hemofílicos no mundo, o Brasil possui 13 mil pacientes cadastrados no sistema do Ministério da Saúde. No mundo esse número chega a 400 mil. No entanto, uma investigação conduzida por pesquisadores canadenses sugere que o número total de casos seja três vezes maior: hemofílicos somariam 1,2 milhão de pessoas em todo o planeta. A hemofilia é caracterizada por problemas de coagulação do sangue causados por uma doença hereditária ligada ao cromossomo X, determinante do gênero feminino.

A pesquisa, conduzida por estudiosos da Universidade de McMaster, no Canadá, contou com a participação de investigadores franceses, britânicos e americanos. A investigação analisou dados de nascimentos de nações da Europa e da Oceania por dois anos. Entraram na pesquisa partos de 1991 a 2015, com ênfase nos últimos 15 anos. A análise descobriu que a cada 100 mil recém-nascidos do sexo masculino, 29 terão hemofilia A e B, principais tipos da doença. A hemofilia A é resultado na falha no fator de coagulação sanguínea número oito. Já o tipo B está associado à deficiência do fator nove. Formado por um grupo de proteínas, os fatores de coagulação são essenciais para a coagulação sanguínea. A ausência ou deficiência em um deles pode causar distúrbios no processo, resultando em sangramentos excessivos. “A coagulação funciona como um jogo de dominó”, explica o hematologista Nelson Hamerschlak, do Hospital Israelita Albert Einstein. “Se uma peça cair, tudo deixa de ocorrer normalmente.”

A grande descoberta dessa pesquisa foi a análise a partir de informações de recém-nascidos. Até hoje, todas as projeções se restringiam a presença da doença em crianças, jovens e adultos. Neste caso, o índice dava conta de 21 indivíduos com a doença a cada 100 mil. Com essas informações, aliadas a variantes que analisam a disponibilidade de tratamento, os pesquisadores conseguiram estimar a expectativa de vida dos hemofílicos em países com alto IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), médio IDH e baixo IDH. Pacientes com hemofilia em nações com o alto desenvolvimento humano possuem 64% de chances de qualidade de vida ruim. Quando o IDH é médio, o índice sobe para 77%. Em nações com baixo IDH, a situação é mais dramática ainda: 93% dos hemofílicos sofrem com uma vida de qualidade ruim.

Sintomas e tratamentos

Os principais sintomas associados à enfermidade são os sangramentos prolongados, que podem ser externos, sob a pele (manchas roxas), nos músculos ou nas articulações – onde ocorrem 80% dos sangramentos. Além disso, dores e inchaço acometem muitos dos pacientes. As principais articulações afetadas são os tornozelos, joelhos e cotovelos, mas pode ocorrer em outras como quadril, ombro e punho.

A profilaxia é o método mais recomendado por médicos de tratamento. Ela consiste na reposição do fator deficiente com uma periodicidade recorrente, ajudando na manutenção da coagulação e permitindo que a pessoa tenha uma vida normal. Em casos mais urgentes, os médicos aplicam infusões que contêm a hemorragia. Geralmente são necessárias duas aplicações para interrompê-la.

Há disponível no mercado duas medicações recentes. Uma delas é para hemofílicos do tipo A. A HEMCIBRA (emiczumabe) é a primeira inovação no tratamento deste tipo da enfermidade depois de mais de 20 anos e é indicado para a profilaxia cotidiana. Outra é para hemofílicos do tipo B. Trata-se do Idelvion, também profilático.

Consequências psicológicas da hemofilia

“Muitas pessoas com hemofilia acabam por ter uma educação defasada, já que elas não conseguem acompanhar os estudos por conta dos repetidos sangramentos. Quando chega na vida profissional também sofre, já que falta muito no trabalho, quando consegue um, por causa dos sangramentos”, explica Mariana Leme, presidente da ABRAPHEM (Associação Brasileira de pessoas com hemofilia”. “É comum, por conta da condição, crianças sofrerem bullying e serem segregadas. Ao decorrer do crescimento essa segregação pode ser social e até mesmo familiar.” Além de todas as dores e sangramentos, crenças negativas associadas à doença prejudicam a qualidade de vida dos pacientes. Uma pesquisa da Universidade do Minho, de Portugal, com cerca de 700 participantes revelou que 40% dos adultos tinham sintomas de ansiedade e 30% de depressão.

Uma das instituições mais importantes no cuidado de hemofílicos, especialmente das crianças, é a escola. “A escola deve se informar com alguém especialista sobre a doença, como ela ocorre, sinais, além do caso específico do paciente. Essa informação é primordial principalmente em crianças pequenas, já que muitas ainda não falam ou não conseguem se expressar direito”, ressalta presidente da associação.

O fato é que, com acesso ao tratamento, fisioterapia e acompanhamento psicológico, o hemofílico pode ter uma vida normal, podendo praticar atividade física, casar-se e ter filhos. Cabe ao Estado e à sociedade saber ampará-lo adequadamente.

(Fonte: Agência Einstein)

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